terça-feira, 19 de março de 2013


Princípio  da insignificância não se aplica a fraude

Por entender que a aplicação do princípio da insignificância deve observar os requisitos de conduta minimamente ofensiva do agente, ausência de risco social da ação, reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica, a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região decidiu que deveria ser recebida denúncia apresentada contra cidadão acusado de furto pela internet.


De acordo com a denúncia, o acusado subtraiu para si, mediante fraude, por intermédio da internet, a quantia de R$ 1 mil. Ele transferiu a importância de conta corrente de terceiro na Caixa Econômica Federal para a sua própria poupança, também na CEF. No mesmo dia, o acusado foi preso em flagrante ao sacar R$ 996 de sua conta.

No entanto, a 12ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal decidiu pela atipicidade da conduta diante da insignificância da lesão ao bem jurídico, no caso R$ 1.996, considerando que a União se abstém de ajuizar execução fiscal nas situações em que o valor do crédito tributário excede, em muito, o montante subtraído pelo denunciado.

  O MPF contestou a sentença alegando que não há que se falar em mínima ofensividade da conduta, tendo em vista que o denunciado foi preso em flagrante por constar uma restrição em sua conta poupança por três saques, no valor de mil reais cada, de origem ilícita, o que “demonstra sua intenção de lesar a empresa pública”. Acrescentou ainda que o salário mínimo vigente na época era de R$ 350 e, portanto, um prejuízo de R$ 1.996 não é inexpressivo.

Ao analisar o caso, a relatora do processo na 3ª Turma, desembargadora federal Mônica Sifuentes, explicou que o juízo de primeiro grau se referiu ao fato de a própria União renunciar ao direito de ajuizar execuções fiscais de valores iguais ou inferiores a R$ 10 mil. Todavia, o Supremo Tribunal Federal já firmou o entendimento de que o reconhecimento da atipicidade da conduta, com suporte na aplicação do princípio da insignificância, deve observar os seguintes requisitos: conduta minimamente ofensiva do agente, ausência de risco social da ação, reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica.

"Assim, na hipótese em comento, ainda que a lesão ao bem jurídico não fosse significativa comparada aos parâmetros da Fazenda Nacional para o ajuizamento da Ação de Execução Fiscal, a conduta não pode ser considerada 'minimamente ofensiva', 'sem risco social' ou de 'reduzido grau de reprovabilidade'", afirmou a desembargadora. Ela ressaltou também que não é insignificante o crime de furto que tenha por objeto bens ou valores superiores ao salário mínimo da época.

Mônica Sifuentes esclareceu ainda que “a conduta do denunciado não foi apenas a de 'subtrair', mas 'subtrair mediante fraude', tendo em vista que, por intermédio da internet, violou o sistema de segurança do banco para, sem nenhuma participação do correntista, subtrair valores de sua conta corrente”. A julgadora citou entendimento anterior da Turma, de relatoria da então desembargadora federal Assusete Magalhães, referente à conduta em questão: “A subtração de valores de contas correntes bancárias, mediante fraude eletrônica, tipifica o crime de furto qualificado que, por sua vez, consuma-se no momento em que o bem é subtraído da vítima, saindo de sua esfera de disponibilidade”. 

sexta-feira, 8 de março de 2013

TRF-4 libera União para divulgar salários de juízes do RS 

A Associação dos Magistrados do Trabalho da 4ª Região não pode impedir que a União divulgue, de forma individualizada e com identificação nominal, os rendimentos dos seus associados. De acordo com entendimento já adotado pelo Supremo Tribunal Federal em maio do ano passado, tal divulgação atende ao princípio da publicidade administrativa e não viola a privacidade, a intimidade e nem a segurança do servidor público.

Este foi o entendimento majoritário da 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ao dar provimento à Apelação da União contra sentença que julgou procedente a Ação de Invalidação de Ato Administrativo manejada pela Amatra-RS — a Resolução 151/2012, emitida pelo Conselho Nacional de Justiça.

O relator do recurso e condutor do voto que prevaleceu, desembargador federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, lembrou que a decisão da Sessão Administrativa do STF se deu por unanimidade. Com ela, destacou, foi permitida a divulgação, ‘‘de forma ativa e irrestrita, dos subsídios dos ministros e a remuneração do seu quadro de pessoal, assim como os proventos de ministros aposentados, dos servidores inativos e dos pensionistas, com base na Lei nº 1 2527, de 18 de novembro de 2011’’.

Além disso, informou o desembargador-relator, o Plenário do STF já havia se manifestado sobre a possibilidade de divulgação dos salários dos servidores do Município de São Paulo, em junho de 2011, em que manteve a suspensão das liminares que impediam a publicação dos dados. Em suma, segundo fração da ementa daquele acórdão, ‘‘a negativa de prevalência do princípio da publicidade administrativa implicaria, no caso, inadmissível situação de grave lesão à ordem pública’’.

Voto divergente

‘‘Creio que o entendimento ora adotado majoritariamente pela Turma não seja a orientação final do Supremo, à qual eu teria de me submeter, e estou negando provimento ao apelo e à remessa oficial, mantendo integralmente a sentença’’, divergiu a desembargadora federal Maria Lúcia Luiz Leiria.

A seu ver, não existe na chamada Lei da Transparência (12.527/11) qualquer determinação de publicação de nomes vinculados a remunerações - o que violaria os princípios da privacidade, intimidade e segurança de magistrados e servidores. Afirmou que a própria Lei, em seu artigo 6º, inciso III, assegura a proteção da informação sigilosa e da informação pessoal no que diz respeito à identificação nominal da pessoa natural identificada ou identificável — conforme o artigo 4º, inciso IV.

Para a desembargadora Maria Lúcia, a intenção do legislador, no caso dos autos, é garantir o controle social sobre a folha de salários dos órgãos públicos, e não sobre a pessoa do servidor. ‘‘Entendo absolutamente suficiente, para os fins que a lei almeja, a identificação da matrícula do magistrado ou servidor e todas as informações vencimentais’’, concluiu em seu voto. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 20 de fevereiro.

O caso

A ação movida pela Associação dos Magistrados do Trabalho da 4ª Região se insurge contra a Resolução 151/2012 do CNJ, órgão fiscalizador da atividade judiciária. O ato administrativo determina a divulgação das ‘‘remunerações, diárias, indenizações e quaisquer outras verbas pagas aos membros da magistratura e aos servidores a qualquer título, colaboradores e colaboradores eventuais ou deles descontadas, com identificação nominal do beneficiário e da unidade na qual efetivamente presta os seus serviços’’.

A tese esgrimida pela Amatra é a de que a forma pessoalizada de divulgação dos rendimentos e dos descontos praticados em relação a cada um dos seus associados não se mostra necessária para a consecução da transparência administrativa. Antes, se afigura contrária aos primados de intimidade, privacidade e segurança.

Ao julgar o mérito do pedido, o juiz substituto Gabriel Menna Barreto von Gehlen, da 5ª Vara Federal de Porto Alegre, afirmou que a transparência é valor constitucional que, evidentemente, deve ser otimizado, conforme dispõe os artigos 5º, inciso XXXIII; e 37, inciso II, da Constituição Federal. ‘‘Sem embargo, sua implementação se deve dar da forma necessária ou, posto de outra forma, sem restrição desnecessária de outros valores constitucionais’’. Acrescentou ainda que um dos instrumentos para materializar este acesso foi justamente a edição da Lei nº 12.527/11.

Entretanto, divulgar o nome de cada um dos servidores, seguido dos pagamentos que lhe foram efetuados, já não se configura informação necessária a um controle social saudável exercido sobre os servidores públicos, advertiu o juiz. ‘‘Aí, a informação já não é necessária ao controle dos custos do serviço público e suas eventuais distorções ou injustiças. O que há, isto sim, é concessão de poder ao 'bisbilhoteiro ou ao criminoso', porque aí há informação que somente a eles importa’’.

Na visão do magistrado, se há meio de se implementar otimamente um princípio constitucional (da publicidade e transparência) sem restringir desnecessariamente princípios colidentes (da privacidade e intimidade), o Estado deve lançar mão deste. "Basta, portanto, que se divulguem as matrículas dos servidores junto aos pagamentos que lhes correspondem, sem referência aos nomes", sugeriu.

Com isso, o juiz julgou parcialmente procedente a demanda, ordenando à União que as ‘‘remunerações, diárias, indenizações e quaisquer outras verbas pagas aos membros da magistratura’’, de que trata a Resolução 151/12 do CNJ, sejam publicadas sem identificação nominal dos beneficiários associados da Amatra IV, mas meramente com as respectivas matrículas.